sábado, 22 de agosto de 2009

ARTE POÉTICA

A poesia não está nas olheiras imorais de Ofélia nem no jardim dos lilases.
A poesia está na vida,nas artérias imensas cheias de gente em todos os sentidos,
nos ascensores constantes,na bicha de automóveis rápidos de todos os feitios e de todas as cores,
nas máquinas da fábrica e nos operários da fábrica e no fumo da fábrica.
A poesia está no grito do rapaz apregoando jornais, no vaivém de milhões de pessoas conversando ou prague­jando ou rindo.
Está no riso da loira da tabacaria,vendendo um maço de tabaco e uma caixa de fósforos.
Está nos pulmões de aço cortando o espaço e o mar.
A poesia está na doca,nos braços negros dos carregadores de carvão,
no beijo que se trocou no minuto entre o trabalho e o jantar—
e só durou esse minuto.
A poesia está em tudo quanto vive, em todo o movimento, nas rodas do comboio a caminho, a caminho, a caminho de terras sempre mais longe,
nas mãos sem luvas que se estendem para seios sem véus,na angústia da vida.
A poesia está na luta dos homens,está nos olhos abertos para amanhã.

Mario Dionisio

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